Arguim

"Ilha na costa ocidental africana, próxima do cabo Branco, a 20º 40' lat. N. e 16º 50' long. W. Nuno Tristão tem passado por ser o descobridor desta ilha, em 1443; no entanto, segundo os testemunhos de Zurara, de Valentim Fernandes e de Diogo Gomes, Gonçalo de Sintra deve ter sido o primeiro a chegar ali. A posse da ilha veio a ser de grande importância para o comércio com o interior africano, e o facto de nela haver abundância de água doce e de peixe contribuiu favoravelmente para a fixação portuguesa. Do ponto de vista comercial as conquistas e praças do Norte de África não haviam correspondido aos objectivos pretendidos. Arguim vai ser o nosso primeiro entreposto comercial na costa africana, onde se fará regularmente durante muitos anos o intercâmbio de ouro e de escravos, por tecidos, cavalos e trigo 'de que os naturais estavam sempre famintos' (Cadamosto, cap. X.). O facto de, provavelmente, ainda em vida do Infante D.Henrique (talvez em 1455, segundo Cadamosto), ali se ter começado a construção de um castelo, terminado, depois da sua morte, por ordem de D.Afonso V, e que a D.João II ainda mereceu cuidados, ajuda a explicar a importância da ilha. Alcaide-mor do castelo (onde ficou desde logo um sacerdote, chamado 'Polono da vila de Lagos'), e, provavelmente, construtor do mesmo foi Soeiro Mendes de Évora. A carta que lhe confere a capitania foi-lhe dada por D.Afonso V, e data de 26 de Julho de 1464. Tal tipo de feitoria virá a ser, afinal, modelo a inspirar futuras fixações costeiras como São Jorge da Mina, Moçambique, e, embora noutro continente e em plano mais grandioso, a própria Goa e até Macau. Na colectânea de Ramúsio (viagem do piloto português à ilha de S.Tomé), a ilha aparece significativamente descrita deste modo: 'onde há hum grande porto, e hum castelo d'el-Rei Nosso Senhor, no qual elle tem guarnição, e hum feitor seu. Arguim é habitada por mouros negros, e aqui são os confins que dividem a Barbaria do paiz dos negros'. Os antecedentes próximos da fundação da feitoria encontramo-los na intenção henriquina de atrair o comércio africano ao Rio do Ouro; João Fernandes é seu fiel intérprete (1445), e, por seu intermédio, se vem a realizar, com Ahude Maimão, a primeira operação comercial do tipo característico nesta zona: ouro e escravos, contra tecidos e trigo. Da intensidade deste tráfico nos esclarece Cadamosto ao dizer que 'todos os anos vão e vêm Caravelas de Portugal à Ilha de Arguim'. Assim, João Fernandes, agente e colaborador do Infante, o qual andara metido durante mais de meio ano pelo interior, tendo aprendido a língua local e os segredos do comércio da região, vem, pois, a ser um dos principais fundadores da feitoria. A mudança da 'conquista' em 'trauto' foi consumada mediante a ligação comercial com os portos marroquinos de Meça, Mogador e Safim, onde se obtinham mantas, alquicés e principalmente trigo, produtos que depois eram trocados na feitoria de Arguim por escravos negros e ouro, que vinham do interior pela rota de Tombuctu até Hodem (Audem). A fixação em Arguim marca, portanto, uma 'fase capital da expansão portuguesa' como diz Jaime Cortesão que ao assunto consagra um lúcido capítulo em 'Descobrimentos Portugueses'. Duranre a segunda metade do século XV, e princípios do XVI, ali se manteve comércio activo, de que nos dão conta, entre outros Zurara, Duarte Pacheco, Diogo Gomes e Cadamosto. Naturalmente, quando o comércio se alargou até mais ao sul, à Guiné, e sobretudo a S.Jorge da Mina, e também quando os planos de descobrimento passaram a visar mais longe, a feitoria perdeu, pela força das circunstâncias, a sua importância. Os Holandeses apoderaram-se dela em 1638."

SERRÃO, J. (1963) Dicionário da História de Portugal, 1º vol.

Popular posts from this blog

Ceuta, Arguim, o Mediterrâneo e o Mar do Norte

Jacome

A feitoria portuguesa de Arguim