Azougui
Teórica mas criticamente considero razoável que João Fernandes tenha percorrido do Rio do Ouro a Arguim um trajecto com vértice em Azougui, ou mesmo Ouadane. Vamos procurar ver porquê.
Creio que é natural aceitar que o episódio de João Fernandes é dependente da realidade geográfica e social da costa ocidental africana. Do Rio do Ouro a Arguim, João Fernandes poderia conseguir viagem apanhando uma das caravanas que do Rio do Ouro largasse. Como é próprio, tal viagem seguiria pelas rotas praticadas. Segundo Zurara, seguiu viagem numa pequena caravana de dimensão pouco mais que familiar. Talvez tal caravana seja o retrato do que por aquele lugar era norma; talvez seja fruto do que a sua negociação e condição permitiam.
Ao invés, qualquer sugestão que nos leve a apontar a uma descida ao longo da costa é pouco credível. Não existem rotas, tráfegos de comércios ou outros, nem tão pouco alguêm se iria predispor a conduzir caprichosamente pela costa um viajante desconhecido. Quem vive junto à costa não tem por hábito deslocar-se. Tratam-se de precárias populações sedentárias de pescadores, mariscadores ou caçadores de foca. Tais grupos não teriam tão pouco meios ou sequer conhecimentos para realizar grandes viagens. Quem se desloca em grandes distâncias são caravaneiros, nómadas ou ambos. E estes fazem-no segundo rotas conhecidas.
É por isso sustentável que na sua démarche João Fernandes possa ter percorrido o sertão até Azougui ou Ouadane, flectindo aí para a costa, em direcção a Arguim. Que o destino tenha sido Arguim e que depois aí se venha a fundar feitoria, não será por certo aspecto fortuito.
Olhando hoje um qualquer mapa das rotas africanas do ouro e escravos que abasteciam os mercados europeus, é altamente razoável pensar que os portugueses tenham escolhido Arguim como entreposto, no sentido de que aí fazia mais sentido atrair (desviando) algum do tráfego que chegava ao Mediterrâneo meridional. Arguim reúne de facto as condições geográficas e estratégicas ideais (e possíveis).
Há objectividade e planeamento em torno de todo este desenvolvimento. E por tudo isto sublinhemos sim a iniciativa de João Fernandes, justamente porque é no seu âmbito que encontramos uma proximidade maior (e mais clara) às questões das rotas caravaneiras do Sahara.
Imagem original: NASA