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Showing posts from 2013

Madeira, Açores e ilhas de Cabo Verde - a navegação ao largo

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Imagem original: NASA A descoberta das ilhas do Atlântico - Madeira, Açores e Cabo Verde - deve ser enquadrada no quadro geral das navegações no Oceano. A descoberta destes arquipélagos relacionar-se-á com os métodos de navegação adoptados no Atlântico Sul para descida da costa ocidental africana. A Madeira, a primeira destas ilhas, era já conhecida e inscreve-se no conjunto das movimentações canarinas, fundamentalmente. A posse e povoamento da Madeira e Porto Santo poderão corresponder a um descobrir de interesses novos ou mesmo a uma re-orientação estratégica da coroa portuguesa quanto a o Atlântico. Só depois de iniciado o processo de povoamento da Madeira, e de descobertas as primeiras ilhas dos Açores, se irá descer a costa africana a sul do Bojador e isso será muito interessante perceber. Regista-se igualmente que o reconhecimento das ilhas de Cabo Verde, a mais de 600km da costa africana, acontece logo imediatamente após chegada às regiões contíguas da costa africana....

Tarfaya, Bojador e Angra dos Cavalos

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Imagem original: University of Texas Libraries (Africa 1:1,000,000. Great Britain. War Office. General Staff. Geographical Section, 1913-, reissued by U.S. Army Map Service, 1942- ).

Rio do Ouro e Arguim

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Imagem original: University of Texas Libraries (Africa 1:1,000,000.  Great Britain. War Office. General Staff. Geographical Section, 1913-, reissued by U.S. Army Map Service, 1942- ).

Estela funerária

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Museu da Lourinhã - GEAL, Grupo de Etnologia e Arqueologia da Lourinhã. Curioso este desalinhamento da cruz com o eixo vertical da estela. (Também aqui).

Juba II

"(…) Juba had a greater contribution to make in examining all of nothern Africa, from the atlantic coast to Ethiopia and the Red Sea, and south into the sub-Saharan districts, thereby providing Augustan Rome with its first detailed study of the region. Juba could bring the culture and history of his new territories into the mainstream." "Juba could also enlighten his audience about the Atlantic coast of Africa, something that has long been a Roman concern. He was especially interested in the matter of circumnavigation of the continent." ROLLER, D. (2003),  The World of Juba II and Kleopatra Selene . Routledge, New York

Da coroação de Juba II

Relato de Dio sobre a viagem de Augusto à Península Ibérica (27-25 a.C.). "When this war ended, Augustus discharged his more elderly soldiers and then establish a city in Lusitania, called Augusta Emerita. For those who were still of military age he arranged exhibitions in the camps under the direction of Marcellus and Tiberius, since they were aediles. And he gave to Juba, in place of his ancestral lands, part of Gaetulia, most of whose inhabitants had been registered in the roman state, as well as the lands of Bocchus and Bogudes."

Numidia e Mauritânia

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Numídia e Mauritânia na Antiguidade Imagem original: Barry Lawrence Ruderman Antique Maps Inc.

Hanno (Hanão)

"É verdade que Cartago viveu sobre o mar e do mar, com tanta ousadia quanto os Tírios. Estes, partindo do mar Vermelho, fizeram certamente, por volta de 600 [a.c.], o périplo de África, às ordens do faraó Necau. Também os navios cartagineses, à procura das minas de estanho, em 450 [a.c.], aproximadamente, conduzidos por Himilcão, percorreram, para norte, as costas atlânticas da Europa até às Ilhas Britânicas (as ilhas Cassitérides). Um quarto de século mais tarde, Hanão conhecia, desta vez a sul, à procura de ouro em pó, as costas atlânticas de África até aos actuais Gabão e Camarões." BRAUDEL, F. (2001) Memórias do Mediterrâneo : Pré-História e Antiguidade. Terramar, Lisboa.

Juba II

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Imagem: Tenerife "By Juba’s day whatever scattered bits of information of early exploration into the Atlantic that existed were perhaps as inconsistent and little understood as they are today. Strabo, a meticulous if opinionated researcher, was surprisingly vague about the African coast, and displayed no knowledge of the voyages of either Hanno or Polybios. When Juba became king, most reports on the Atlantic coast were over a century old and tended to be ignored, or even to be rejected as mythical. Thus one of his priorities as geographer king was to provide Augustan Rome with definitive information about this portion of his new kingdom. His interest may have been heightened because Polybios, one of the more recent explorers, had been received at the Numidian court in the days of Juba’s great-great-greatgrandfather Massinissa. Learning that the Atlantic coast was a way to India, the king may also have begun to see the commercial possibilities that this implied." (1) ...

Movimentos Insulares

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Proposta de enquadramento das ilhas atlânticas nas navegações ditas henriquinas . Sugestão gráfica para as descobertas dos Açores e ilhas de Cabo Verde em função das operações de descida à costa africana e regresso. A prévia tentativa de passagem do Bojador enquadrada com as ilhas canarinas, Madeira e Açores. O avanço para a costa africana e a Madeira como pivot fundamental.

4 de Março de 1394

"Capítulo VII No qual se mostram cinquo razooes porque o senhor iffante foe movido de mandar buscar as terras de Guynea. "Mas sobrestas cinquo razooes, tenho eu a vj., que parece que he raiz donde todallas outras procedem; e isto he, inclinaçom das rodas cellestriaaes, ca como eu screvya nom ha muytos dyas, em hua epistolla que envyava ao senhor rey, que posto que seja scripto que o barom sabedor se assenhorara das estrellas, e que os cursos das planetas, segundo boa estimaçom dos santos doutores, nom podem empeecer ao boõ homem, manifesto he porem que som corpos ordenados no mesteryo de nosso senhor Deos, e correm per certas medidas e a desvairadas fiis, revelladas aos homees per sua graça, per cujas influencias os corpos mais baixos som inclinados a certas paixoões. E se asssy he fallado como catholicos, que as contrairas predestinaçoes das rodas do ceeo, per natural juizo, com algua devynal graça, se podem estorvar, muyto mais de razom está, que as que proveitosamente pe...

Horóscopo

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Horóscopo medieval, cerca 1411. Horóscopo do Sultão Iskandar, dinastia persa Timurid. Imagem original: Museum of the History of Science. University of Oxford.

Jafudà Cresques

Durante grande parte do século passado aceitou-se que a figura de Jacome, primeiramente referida por Duarte Pacheco Pereira no Esmeraldo, poderia ser Jafudà Cresques (1360-1410), filho de Cresques Abraham (1325-1387), ambos reconhecidos cartógrafos maiorquinos judeus. Jafudà, que depois de uma forçada conversão ao cristianismo adopta o nome de Jaume Ribes (1391), ter-se-á instalado, a convite do Infante D.Henrique, em Portugal, terra onde ficaria conhecido como Jacome de Maiorca e onde teria mesmo depois dado início à famosa "Escola de Sagres" (Llabrés; Reparaz; Pastor e Camarero, 1959; e Vernet, 1975). Porém, comprovadamente, sabe-se hoje que as coisas não terão sido inteiramente assim. Sobretudo sabe-se que Jafudà Cresques terá falecido cerca 1410 (Riera i Sans, 2009). Se chegou a estar em Portugal, não foi seguramente a mando do Infante D.Henrique e esta nuance pode ter sido pouco notada, porque Jafudà, como vamos perceber, pode mesmo ter estado em Portugal. Em outras ci...

Jacome

"(…) [I]sso mesmo mandou [o Infante D.Henrique] à ilha de Malhorca por um mestre Jacome, mestre de cartas de marear, na qual ilha primeiramente se fezeram as ditas cartas, e com muitas dadivas e merces ho ouve nestes Reynos, ho qual as ensinou a fazer áquelles de que os que em nosso tempo vivem, aprendéram." Em o  Esmeraldo de Situ Orbis  (séc. XIV) de Duarte Pacheco Pereira (1460-1533). "(…) [M]ándou vir da ilha de Mallorca um mestre Jacome, homem mui douto na arte de navegar, que fasia e instrumentos náuticos e que lhe custou muito pelo trazer a este reino para ensinar sua sciencia aos officiaes portuguezes d'aquela mes ter." Em  Décadas da Ásia (séc. XIV) de João de Barros (1496-1570). Quem quer que tenha lido as Décadas e o Esmeraldo percebeu que o capítulo de João de Barros onde surge a sua citação ao "mestre Jacome" é transladado de Duarte Pacheco Pereira. Daí que as referências à "arte de navegar" de Jacome ou ao "fabr...

O uso do Astrolábio

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Uso do astrolábio (séc. XIII). Três clérigos procedem à medição de astros e anotação de valores para construção de horóscopo. Iluminura do Livro dos Salmos (Antigo Testamento) de Branca de Castela (1188-1252), filha de Afonso VIII  de Castela (1155-1214), e esposa de Luís VIII de França (1187-1226). Imagem: Bibliothèque Nationale de France

O Astrolábio náutico

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O Astrolábio náutico é um instrumento simplificado do Astrolábio comum, dito "planisférico", cuja função se limita à medição da altura de astros. Directamente pelo sol ou a estrelas significativas é possível o cálculo da declinação dos astros e pela conjugação com a leitura de tabelas astronómicas a consequente determinação da latitude. É constituído por um disco graduado em cujo centro se fixa o alidade. No extremo superior do eixo vertical do astrolábio deve existir fixação para suspensão. A estabilidade será o último dos requisitos necessários. Imagem: Odyssey's Virtual Museum

Astrolábio

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Astrolábio. Estatuária da fachada principal (c.1225) da Catedral de Notre-Dame de Paris. Em Paris, ao tempo da obra da Catedral, encontramos Guillaume d'Auvergne (1190-1249), clérigo da Notre-Dame de Paris e depois bispo da mesma cidade. Guillaume inscreve-se num circuito intelectual precursor de uma aproximação dos Clássicos à Doutrina Cristã, tema que adquirira uma visibilidade nova a partir da chegada de Gerbert d'Aurillac (c.946-1003) ao lugar de Sumo Pontífice. Gerbert d'Aurillac foi figura de proa, entre outros aspectos, pela chancela que imprime à promoção dos estudos Clássicos e árabes nos meios literatos medievos da Cristandade, e em igual medida foi particularmente responsável por um patrocínio na recuperação de instrumentos como o ábaco, o quadrivium ou a esfera armilar. Gerbert passara pela Península Ibérica onde estudara em jovem. A Península é no capítulo da Cosmologia um dos vértices fundamentais do pensamento e conhecimento medievo. Toda a Cosmologi...

Sta. Maria da Graça de Lagos

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Estela funerária do cemitério medieval da Igreja de Sta. Maria da Graça , Igreja Matriz de Lagos. Sta. Maria da Graça é edificada em 1378, ao reinado de D.Fernando, recebendo melhoramentos em 1420 a mando de Soeiro da Costa, alcaide de Lagos. Lourenço Estevens financia a construção do Sacrário. Igualmente no primeiro quartel de Quatrocentos, Lourenço Dias funda aí uma irmandade do Senhor Jesus. O terramoto de 1755 destrói por completo o edifício, tendo sido posteriormente abandonada, já ao séc. XIX, uma tentativa de reconstrução no local. A fase inicial do cemitério da Igreja de Sta. Maria da Graça de Lagos é constituída por um núcleo disperso de sepulturas escavadas no substrato rochoso, para Sul e para Este do suposto local da igreja. Desta fase registaram-se 56 enterramentos em fossas - de tipologia oval, antropomórfica e pseudo-rectangular - maioritariamente orientadas W-E. É apontado um intervalo entre o final do séc. XIV e meados do séc. XVI para este nível de enterrame...

Dimensão histórica

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O definhar das contendas Ibéricas Trecentistas como antecâmara dos fluxos portugueses ultramarinos; e a co-regência de D. Duarte.

Carta de Ventos e Correntes do Oceano Atlântico

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Carta de ventos e correntes do Oceano Atlântico [Material cartográfico] : 1º. trimestre, 1ª. série, parte Norte / Comissão de Cartographia ; pelos officiaes da armada, J. J. de Barros [et al.] ; Sob o plano do fallecido Vice Almirante João Carlos de Brito Capello ; Des. Tavares Pereira. - Escala [ca. 1:14000000 na zona Equatorial]. - [Lisboa] : A Editora, 1905. - 1 mapa : color. ; 36,00x42,40 cm em folha de 45,00x57,15 cm Imagem: Biblioteca Nacional de Portugal

O Golfo de Arguim no Mapa-mundo de Fra Mauro

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Talvez seja razoável reconhecer no mapa-mundo de Fra Mauro a primeira representação cartográfica conhecida do Golfo de Arguim e isso deve-se sem sombra de dúvida aos resultados das expedições portuguesas do séc. XV. Como o próprio cosmógrafo deixou legendado no seu mapa, o rei de Portugal, D. Afonso V, providenciou-lhe algumas Cartas da costa ocidental africana conhecida. Imagem: Cópia do séc. XIX (1804), comissionada pela Companhia Britânica das Índias Orientais, do Mapa-mundo de Fra Mauro, monge cosmógrafo do mosteiro camaldulense de Murano, Veneza, autor do grande mapa encomendado pela Coroa portuguesa em meados de Quatrocentos. Original em Wikipédia.

As Primeiras Navegações (e os levantamentos cartográficos)

Tratam-se de 3, possivelmente 4, as viagens documentadas na década de 30, a que acrescem na década seguinte (até antes da data da carta de privilégio ao infante ), outras tantas. Teremos alguma margem de manobra para avaliar, pelas condições necessárias à concretização dos levantamentos solicitados pelo infante D. Henrique, onde, quando e como se executou a Carta de marear? Vamos procurar saber. Antes de 1434, dezena e meia de viagens bem contadas realizam-se na tentativa de descer além do Bojador, inclusive com Gil Eanes, comprovadamente no ano anterior. Oliveira Marques refere que nesses anos, por exemplo, citando Zurara e Valentim Fernandes, um tal Álvaro Fernandes Palenço e um outro Álvaro do Cadaval navegam ante o cabo Bojador (1). Em 1434 o escudeiro do infante, Gil Eanes, a residir em Lagos, vence, ao que tudo indica, o cabo Bojador. Eventualmente estamos ainda a falar do cabo Juby ou Buyeder (também Bugeder). No ano seguinte Gil Eanes retorna fazendo acompanhar-se de um...

As primeiras representações cartográficas de Arguim na Cartografia Medieval (II)

No trecho da carta de privilégio antes apresentado , foi dito que o infante mandara fazer Carta de marear. Ficou implicitamente percebido que a feitura da Carta terá decorrido algures entre 1434 e 1443. Zurara, aludindo a uma Carta de marear na Crónica da Guiné, avança a 1446. Estamos a acompanhar aditamentos e isso está claro no texto do cronista: "E foe achado que ataa esta era de iiijRvj (1446) anos do nacimento de Jhu Xpo, foram em aquellas partes cinquoenta e hua caravellas (…) E foram estas caravellas a allem do Cabo iiiijL legoas. E achasse que toda aquella costa vay ao sul, com muytas pontas, segundo que este nosso principe mandou acrescentar na carta de marear." (1) Dito de outra forma. Foi registada (na carta de privilégio) uma iniciativa de se fazer uma Carta de marear das zonas de África para lá do Bojador, ao que até 1446 se fazem averbar novos levantamentos. Isto prenuncia a eventual feitura e existência de um Padrão cartográfico. Saliento o dado mais signi...

As primeiras representações cartográficas de Arguim na Cartografia Medieval (I)

"E por ser cousa duvidosa [a terra que era alem do cabo de Bojador] e os homes se nom atreverem de ir mandou [o infante D. Henrique] lá bem xiiiij vezes atees que soube da parte da dicta terra e lhe trouveram dela per duas vezes huns xxxbiij mouros presos e mandou dela fazer carta de marear." (1) Referência a carta de marear, ao que tudo indica feita entre 1434 e 1443. Estamos diante a possibilidade de presença a bordo de indivíduos preparados para a realização de levantamentos cartográficos, eventualmente logo nas primeiras navegações ao Bojador e a sul do cabo, ainda durante a década de 30. É bom perguntar, por conseguinte, com que meios e com que homens se realizou tal trabalho? É ainda razoável ponderarmos tratar-se esta carta que o infante mandou executar de um padrão náutico (com levantamentos, aferição e assentamentos) para derrotas na costa africana. (1) Chanc. D. Afonso V, L. 24, fls. 61-61 v. Místicos, L. 3, fl 278 v. 22 de Outubro de 1443 ANTT Carta de privi...

Rumo a Arguim (II)

As Viagens de aproximação e reconhecimento do Golfo de Arguim: 1441 - Nuno Tristão avistou o Cabo Branco (sem o descobrir); 1442 - Gonçalo Afonso de Sintra e Dinis Dias reconhecem o Cabo Branco e a Furna e avistam os baixos de Arguim (sem os reconhecer); 1443 - Nuno Tristão descobre as ilhas de Adegete e Garças; 1444 - Lançarote de Freitas (com Gil Eanes, Nuno Tristão e Gonçalo de Sintra) descobre as ilhas de Naar e Tider; 1444 - Gonçalo Afonso de Sintra descobre Arguim; 1445 - Antão Gonçalves, Garcia Homem e Diogo Afonso recolhem João Fernandes junto a Arguim (que no Rio do Ouro havia ficado, 7 meses atrás, em expedição anterior do mesmo Antão Gonçalves juntamente com Gomes Pires). Observando um mapa do Golfo de Arguim, poderá estranhar-se esta cronologia. Afinal Gonçalo de Sintra desce em Arguim quando um ano antes já se navegava na região sul do golfo. Há uma descrição no Esmeraldo que dá teoricamente suporte a um reconhecimento descontinuado do golfo, pelo que a ilha de A...

Rumo a Arguim (I)

Para Jaime Cortesão, as primeiras navegações de Gil Eanes e Afonso Gonçalves Baldaia (1434, 35 e 36) balizam um momento de estudos incipientes do mar, das correntes e dos ventos, junto e ao largo das Canárias e costa marroquina. O posterior cruzar destes dados de navegações com os anteriormente adquiridos nas navegações que permitiram chegar e depois fazer rota entre o Continente e as ilhas da Madeira e Açores, entrocam e enformam algo bem mais substancial no âmbito das navegações de e para o Atlântico Sul, a começar pelas primeiras navegações à Guiné. É esta conjuntura que nos permite aventar como provável que as viagens da década seguinte, e daí em diante seguramente, estejam já a usar a volta pelo largo. E assim é no regresso, mas igualmente na rota que desce o Atlântico, seguindo pela Madeira e para lá da ilha de Palma rumo ao Rio do Ouro, Arguim, e progressivamente alargando o arco à Guiné e depois.

Arguim: uma bibliografia prévia

Para o estudo das navegações onde se inscreve a descoberta de Arguim, as Fontes que temos são (adaptado de Vitorino Magalhães Godinho): A Crónica dos Feitos da Guné , de Zurara (c.1410 - 1470); A  Relação dos Descobrimentos da Guiné e das Ilha s, de Diogo Gomes (c.1420 - c.1500); O  De Inventione Africae Maritimae et Ocicidentalis , de Jerónimo Münzer (1437 - 1508); O Esmeraldo de Situ Orbi s, de Duarte Pacheco Pereira (c.1460 - 1533); A Descrição da Costa de Ceuta à Guiné , de Valentim Fernandes ( ? - 1518/9); As Décadas da Ásia , de João de Barros (1496 - 1570). Atendendo às complexas relações (e mesmo as incongruências) identificadas entre trabalhos, é fundamental sempre fazer uma análise crítica. Datas, nomes e factos surgem, não poucas vezes, de forma divergente de texto para texto.

O castelo de Arguim

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Imagem: Wikipedia Arguim pelo cartógrafo e ilustrador holandês Johannes Vingboons (1616-1670). Eventualmente a mais antiga, mas sobretudo talvez a única representação do castelo original que Soeiro Mendes ergueu na ilha. Há outras representações e levantamentos, todavia espelham já transformações posteriores. Britânicas garantidamente. Sobre a fundação do castelo de Arguim, diz Duarte Pacheco Pereira o seguinte: "E na ilha de Arguim está um castelo que ali mandou fazer o excelente rei D. Afonso, o Quinto, por Soeiro Mendes de Évora, fidalgo de sua casa, depois da morte do Infante D. Anrique; ao qual Soeiro Mendes fez mercê da alcaidaria-mor desta fortaleza e pera seus filhos. E os Alarves e Azenegues trazem a Arguim ouro que ali vem resgatar, e escravos negros de Jalofo e de Mandinga, e couros de anta pera adargas, e goma-arábica e outras cousas; e de Arguim levam panos vermelhos e azuis, de baixo preço, e lenços grossos e bordates, e mantas de pouca valia que se faze...

Arguim: a Cerne do périplo de Hanno

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Major James Rennell No séc. V a.c., Hanno, almirante cartaginês, afirma ter navegado no mar Oceano para lá das Colunas de Hércules, tendo percorrido depois destas igual distância à que fizera de Cartago às Colunas, e assim alcançando uma pequena ilha, recolhida no interior de grande baía da costa ocidental africana, a que chamou de Cerne. Foi Plínio, o Velho , ao séc. I d.c., na sua monumental Naturalis Historiae , obra de carácter enciclopédico, quem talvez primeiro tenha anotado o relato de Hanno. No primeiro quartel de Quatrocentos, talvez alertado sobre a questão das navegações antigas no Oceano, o cartógrafo maiorquino Mécia de Viladestes repescou o tema da narrativa clássica, tendo então desenhado numa carta-portulano sua, em 1413, uma galé a sul das Afortunadas, eventualmente assinalando a viagem do almirante. Será antes a viagem de Jaume Ferrer ao Rio do Ouro? Talvez sim. Também Duarte Pacheco Pereira (1460-1533) levou bastante a sério o relato de Hanno, que lê em Pl...

Nos bancos de Arguim

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Le Radeau de la Méduse  (1818-1819) Oil on Canvas Théodore Géricault Louvre, Paris Imagem: Wikipedia

Do Cabo Bojador a Arguim

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Imagem original: NASA Delicioso relato de António Borges Coelho da viagem expedição de 1445 "Lançarote, os juízes, o alcaide e os oficiais da vereação da vila de Lagos obtiveram licença para nova expedição. Nesta terra fizestes a maior parte das vossas armações, disseram ao Infante. Além de Lançarote, os capitães eram Soeiro da Costa, seu sogro, que tinha estado na batalha de Azincourt, Álvaro de Freitas, comendador da Ordem de Santiago, Gomes Pires, patrão d'el-rei, Rodrigo Anes de Travassos, criado do Regente e escudeiro mui adido, Palenço que fizera grande guerra contra os mouros, Gil Eanes de Lagos e Estevâo Afonso. De Lagos partiam 13 caravelas. De Lisboa e da ilha da Madeira, o resto. Dinis Dias, o primeiro que passou à terra dos negros, armou a caravela de D. Álvaro de Castro; Tristão, um dos capitães da Madeira, capitaneou a sua; ia outra caravela da Atouguia; João Gonçalves Zarco enviava duas caravelas. A expedição juntou 26 caravelas, mais a fusta do Pal...

O Comércio de Arguim

De Vitorino Magalhães Godinho lemos o seguinte: "Na Relação de Diogo Gomes lê-se que no tempo do Infante D. Henrique os alarves traziam a Arguim ouro em pó, pagando-lhes os portugueses com trigo, mantas e outras mercadorias; e indica-se que estas transacções continuavam à data da redacção desse relato, ou seja, na última década do século XV. Este ponto é confirmado por Münzer, que esteve em Portugal em 1494, pois diz que se troca actualmente trigo por ouro e panos por escravos e outras cousas. (…) O comércio de Arguim manteve-se florescente no meio século de 1455 a 1505. (…) Não sabemos qual o total de escravos que teriam vindo de Arguim desde 1450 a 1505. Se supusermos que se manteve a média anual de 750 referida por Cadamosto relativamente a 1455, teremos 41250. Não há razões para crer que o número anual fosse inferior a algumas centenas, de modo que ao todo não ficaria talvez abaixo de 25000. Deve notar-se que parte era reexportada para Castela, Aragão e outros países. O tota...

A feitoria portuguesa de Arguim

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Na imagem, Ouadane . Entreposto em oásis sob o eixo senegalês-marroquino das rotas do ouro e escravos, e que poderá ter estado na base da fundação da feitoria portuguesa de Arguim na costa ocidental africana. A visão portuguesa sobre Marrocos não se pode ler dissociada do enredo Peninsular. Qualquer que seja a perspectiva, será sempre intrínseca da questão castelhano-aragonesa. Em que medida? Na medida de uma gestão de equilíbrios, influências e pressões: na Península; indirectamente na Europa; nos acessos ao Mediterrâneo e Mar do Norte; na posição de força sobre estas questões; e por último no abrir de opções para o Atlântico Sul, se bem que, pelo menos aqui, nos deparemos internamente diante estratégias díspares em face do tema marroquino e africano. Em termos genéricos, os sinais de que uma posição portuguesa sobre o Atlântico Sul havia sido clarificada em meados de Quatrocentos, percebe-se, objectivamente, com a inauguração da feitoria de Arguim. Esta posição é reforçada...

Ceuta, Arguim, o Mediterrâneo e o Mar do Norte

De Jorge Borges de Macedo lemos o seguinte: "A conquista e conservação de Ceuta foi acompanhada, muito de perto, pela expansão marítima portuguesa de que resultou a descoberta da viagem de ida e volta para a Madeira e a inclusão desta na vida europeia. O ter sido descoberta despovoada, ao contrário do que sucedia com as Canárias, mostra os limites da tecnologia naval europeia e o progresso que os portugueses lhe deram. O povoamento da ilha, assim como o tráfego de Arguim e a presença portuguesa em Ceuta levaram a que se constituísse uma área de influência europeia inteiramente nova e que, a pouco e pouco, acabou por permitir que se constituísse uma forma de apoio atlântico diferente da que se centrava no Mar do Norte, saturado de compromissos. (…) Esta orientação não deve levar-nos a supor D. João I desinteressado das relações com o Norte da Europa. Também nesse campo tem cabimento a sua política marroquina. O papel de Ceuta veio a ser reforçado pelo desenvolvimento da explora...

1434

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Os Esponsais (dos Arnolfini) (1434) Jan Van Eyck National Gallery, Londres.

O Cabo Bojador

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Casa Mar de Tarfaya Não havendo razão substancial para o entreposto britânico de Tarfaya ter sido fundado sobre os baixios do cabo homónimo, só uma lógica de perigosidade à navegação, que já os portugueses haviam experimentado nas primeiras décadas de 1400, justificaria tal iniciativa. Se bem também que eu não descure uma existência prévia à inglesa de uma outra construção menor, no mesmo local, e que por si só quase justificaria simpaticamente aquele investimento peculiar. Sobretudo, e antes de mais, o cabo que Gil Eanes passa em 1434 deverá ter sido, muito provavelmente, este cabo de Tarfaya, ou cabo Juby, e que a cartografia maiorquina, ou mesmo um personagem como Jéan IV de Béthencourt - a quem o Infante D. Henrique segue com particular atenção - assinalam como o de Buyeder ou Bugeder. Na carta-portulano de Meciá de Viladestes (1413) vemos este Buyeder. E sublinhamos uma linha de costa descendo para sul num (então ainda) significativo desconhecimento cartográfico. ...

Antes de Arguim, antes de Tânger: Ceuta

A partir do século XV, dois caminhos apresentavam-se a Portugal. "Um consistia em aproveitar a sua posição de vencedor e reforçar as resistências peninsulares a Castela, arriscando-se ao dolo das alianças constantemente negociadas e a guerras intermináveis. Um segundo era procurar outras posições de segurança no oceano Atlântico ou através dele. O caminho adoptado foi este último." As razões para Ceuta visavam portanto o "equilíbrio das forças internacionais (…) com vista a assegurar para Portugal uma maior área de intervenção para o equilíbrio peninsular ibérico" . Borges de Macedo, J. (2006). História Diplomática Portuguesa: Constantes e Linhas de Força . Tribuna da História, Lisboa.

Rotas caravaneiras transarianas

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Imagem original: NASA Súmula das rotas caravaneiras para o reino de Fez (Sidjilmassa e Marraquexe). Acessos à costa da malagueta e do ouro (Senegal, Gana, Axém, etc.). Vector maior de Tombouctou para o Cairo. Por último Arguim no contexto das rotas continentais.

Tânger e Arguim: um problema, duas soluções

Podemos conjecturar que o avançar das viagens para sul, e sobretudo a solução de Arguim, terá também tido a ver com a política fracassada de Tânger. Para explicar esta sugestão, enquadremos sucintamente o tema. Em causa está Marrocos e as seculares relações de Marrocos com a Península. Ainda que indirectamente a braços com a ocupação muçulmana, Portugal entende Marrocos, de facto, à luz daquela circunstância, e parte para o Atlântico focado na questão marroquina e num tema particular do ocupante magrebino: as rotas e caravanas do ouro africano. Porém, antes da partida para Marrocos, Portugal tem um conhecimento fragmentado da realidade magrebina e africana. Duas décadas depois está claro que para se chegar ao ouro africano não basta ter em mãos os entrepostos de acesso das rotas do ouro ao Mediterrâneo. Duas estratégias se colocam. Dominar as estruturas políticas do reino de Fez, ou dominar os mecanismos dos comércios africanos e da famosa rota do ouro do "Sudão". Tânger s...

"O complexo das ilhas e do Noroeste africano - séc XV"

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Godinho, V. (2007). A Expansão Quatrocentista Portuguesa . Dom Quixote, Lisboa.

"Precolonial trade routes"

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Connah, G (2002). African Civilizations: An Archaeological Perspective (second edition). Cambridge, UK

A Costa Ocidental Africana

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Imagem original: NASA Extraordinária perspectiva sobre a costa ocidental africana, a norte do equador, foco das viagens henriquinas (1418-1460). Bela imagem também sobre a natureza de alguns fenómenos atmosféricos à escala continental.

Cartografia de interesse português do séc XIV e XV

A listagem de Vitorino Magalhães Godinho (adaptada) 1. Carta pisana - sem data (final do séc. XIII) - Génova; 2. Mapa-do-mundo de Marino Sanuto; 3. Planisfério de Giovanni da Carignano - sem data (cerca de 1320); 4. Atlas de Pietro Vesconte - Génova - 1321; 5. Portulano de Angelino Dalorto - Génova - 1325; 6. Planisfério de Angelino Dulcert - Maiorca - 1339; 7. Atlas Mediceu ou Portulano Laurenziano - 1351, modificado cerca de 1400; 8. Mapa dos Pizzigani - Veneza - 1367 9. Atlas Catalão (dos Cresques) - 1375-7; 10. Atlas de Pinelli-Walknaer - Génova - 1384 11. Mapa de Guilherme Soleri - Maiorca - 1385; 12. Atlas de Nicolau Pasqualini - 1408; 13. Carta de Maciá de Viladestes - Maiorca - 1413; 14. Planisfério de Alberto de Virga - 1415; 15. Carta náutica de 1424 de Zuane Pizzigani (veneziano); 16. Portulano de Giacomo Giraldi - Veneza - 1426; 17. Planisfério de Battista Beccario - Génova - 1435; 18. Carta de Andrea Biancho - Veneza - 1436; 19. Carta de Gabriel de Val...

Carta-portulano de Francesco Becario

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Becharius, F. (1403). [Portolan Chart Showing the Mediterranean and Black Seas, the Atlantic Coasts of Europe and Africa, and the Eastern Atlantic Ocean]. General Collection, Beinecke rare Book and Manuscript Library, Yale University. Documento de 1403 realizado em Savona por Francesco Becario, depois de uma temporada em Barcelona onde terá trabalhado com Jafuda Cresques. O desenho e identificação das ilhas do arquipélago madeirense no mapa de Viladestes ( post anterior ), encontravam-se já neste mapa de Becario.

Carta-Portulano de Mecia de Viladestes

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Carte marine de l'océan Atlantique Nord-Est, de la mer Méditerranée, de la mer Rouge, d'une partie de la mer Caspienne, du golf Persique et de la mer Baltique - Mecia de Viladestes me fecit in anno MCCCCXIII. Bibliothèque Nationale de France. Documento maiorquino de 1413 com representação dos arquipélagos atlânticos das Canárias, Madeira e Açores, e onde existem já os nomes de Porto Santo, Legname e Deserta.

"Descobertas" henriquinas

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Mapa das "descobertas" henriquinas (Russell, 2004). (Interessante contraponto com as rotas saarianas do ouro e outros comércios de Timbuktu a Ceuta). Como Yves Lacoste apontou (Lacoste, 2006), depois da tomada de Ceuta, projecto que entre outros fins procurava perceber as razões do declínio de Ceuta na rota de abastecimento de ouro ao Mediterrâneo Ocidental, o objectivo fixar-se-á em descobrir os entrepostos recuados e as fontes do ouro africano. Em meu ver, é neste enquadramento que o texto  " De Prima Inventione Guineae " (séc XV-XVI) surge e é essa a preocupação maior do relator: as rotas e os comércios  africanos, em geral, e do ouro, em particular. As referências no texto a Timbuktu e às caravanas saarianas são muito significativas.

Antropocentrismo

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Iluminura do "Liber Divinorum Operum Simplicis Hominis"  (1165) da monja Hildegarda de Bingen (1098-1179).

Esmeraldo de Situ Orbis

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A raridade  sui generis  do " Esmeraldo de Situ Orbis ", o famoso roteiro de Duarte Pacheco Pereira, dever-se-á, na proposta da tese de Domingues (1), não à informação privilegiada que esconde, o que tem sido avançado até aqui, antes sim por se abrigar numa mundividência que os factos coetâneos tornaram obsoleta. Será assim com base neste ponto que o roteiro terá perdido a sua credibilidade e pertinência.  As navegações em curso, assinaladamente a identificação do continente americano e sua circumnavegação, demonstraram a inexactidão das palavras do Esmeraldo. Não foi porém a raridade a trazer reconhecimento ao Esmeraldo. Domingues vai ao encontro da questão. A fama deve-se a uma leitura desvirtuada do texto, onde se pretende fazer uma leitura de descoberta do Brasil em 1498. Para Domingues é sim necessário inscrever as palavras de Duarte Pacheco Pereira no tempo e perceber o seu pensamento e a sua mundividência. Segundo o investigador, as palavras do Esmeraldo...

O Curach

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Pequena embarcação com estrutura de madeira e revestida de peles, de três ou quatro remos, usada nas ilhas Britânicas, pelo menos desde a Alta Idade Média. Cerca do ano de 500 é descrita pela primeira vez pelo poeta latino Avicena. Composições mais complexas, com vela, terão servido na ligação entre a Irlanda e as ilhas Féroe. Segundo o monge Dicuil (séc. IX), tal feito (em dois dias e duas noites com vento de feição) terá sido conseguido por confrades ermitas por volta do ano 825 (in "Liber de orbis Mensura Terrae"). Ari Thorgilsson (1067-1148) relata, posteriormente, que aqueles abandonaram as Féroe à chegada dos primeiros Vikings, deixando para trás os pertences, particularmente os livros e os báculos.

Cartografia medieval

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Fragmento de Mapa-mundo do Apocalipse de Lorvão (1189), cópia ilustrada (de Egeas do Mosteiro de São Mamede de Lorvão) do " Commentarium in Apocalypsin " (776) de Beato de Liébana (701?-798). O descortinar em Quinhentos de uma realidade nova do mundo, de uma ecúmena não mais tripartida, tal como a cartografia alto medieva difundia, não deixou incólume o afeiçoamento medievo europeu à teologia cristã. O crepúsculo da Idade Média é notoriamente matizado por uma reforma da Cristandade Ocidental. Neste contexto, também o surgimento dos mecanismos do capitalismo e do colonialismo coincidem com a emergência de uma metafísica antropocêntrica divorciada de uma comunhão com a figura de Cristo. É peculiar o processo paralelo de quase metamorfose da cartografia, a partir de Quatrocentos, com o surgimento das cartas-portulano. A representação do mundo escapa então já à obediência teológica, relegando essa para aspectos simbólicos, onde se alude tão só à eventual existência de lug...